quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

A des-descoberta: Darwinismo social, my ass.


 

Acho que a palavra que põe os devidos pingos nos is é sorte. E não adianta. Tem quem nasça com ela, tem quem nasça sem. Pode perceber. Tem nego (sem qualquer alusão ao charge acima) que, de criança, ganha aquele brinquedo sorteado na escola, é o preferido da avó, o mais bonito da turma, corre e não cai, come e não engorda, faz piada e todo mundo ri, faz cagada e ninguém descobre. Então, não vou falar aqui dos medianos, que passam a vida despercebidos, ou dos underdogs, que sofrem bullying a vida inteira, colecionam gatos obesos e morrem aos 46, mais obesos ainda. Não. Esse não é um post dramático e não tem qualquer finalidade social. É um post-constatação, e só.

Pode até parecer simplista, mas não é, não. Na verdade, é quase que uma meia-teoria (porque uma metade é quase que constatação histórico-empírica e a outra metade cada um quase que desenvolve como bem entender, ou não).

Pois bem. No começo, bem no comecinho, eu achava, - como meus pais ingenuamente me ensinaram, - que o mundo era governado pela meritocracia branca e objetiva do o que se planta, se colhe. Simples e justo. Então, quando via o bonitão, bom na escola, nos esportes, com as garotas, e, ainda, de Super Nintendo debaixo do braço (aquele que, de década em década, sorteavam na escola), virgulava os pensamentos e justificava tudo aquilo com uma explicação óbvia. É porque ele é um bom menino. Ele estuda. Ele é educado e gentil. Ele é cuidadoso. E já que nada vinha do nada, as justificativas eram sempre um blend de genética e esforço. A bom gato, bom rato, e em pé de morango, laranja não dá. Justíssimo.

Pois que fui crescendo, e à medida que comparava os Pedrinhos, percebia que o buraco era mais fundo, a Terra, redonda, e os meus pais, quadrados. E que não era mérito, que nada. Era muito mais complicado e menos justo do que parecia: o sucesso do Pedrinho dependia de variáveis muitas além da carga cromossômica e do esforço do moleque. E a Teoria do Mérito, ainda que reinasse em alguns raros lugares, ela, e ela também, era arbitrária. Como todo o mais.

Triste, eu sei. Mas além do genótipo, do fenótipo, do esforço e da dedicação, notei que o Pedrinho contava com a malandra da sorte. Ele contava com as circunstâncias. Com o momento. Com a afeição da Tia Telma, da terceira série, que achou que ele se parecia com o sobrinho paraplégico filho da irmã do meio e resolveu dar aquele 0,5 que faltava em matemática. Com a sensatez corporativa do chefe, que entendeu ser melhor promover ele do que o João, que já é mais velho e vai acabar associado A e exigindo aumento astronômico. E essa combinação de variáveis, constante e continuamente, tem vez que fazia do Pedrinho uma criança de ouro, tem vez, um gordinho azarado. E, depois, na vida adulta, as variáveis transformavam o Pedrinho no Pedro dos 29 gatos ou no Doutor Pedro, empresário e investidor, casado com aquela atriz da Globo.

E aí que, quando disse coisa parecida entre amigos dia desses, me perguntaram, e a meritocracia, nessa história? E eu respondo, meus caros, que ela, de verdade, não existe não. É palavra bonita de incentivo, e só. Que ainda não inventaram medidor objetivo de habilidade, inteligência e esforço, e quem mede é quem mede. É a Tia Telma. É o chefe. Sou eu. É o Pedro. Os mais arbitrários dos arbitrários.

Eis então que a grande descoberta foi, na verdade, uma des-descobertaPela sua teoria, o sucesso é um suco – minha avó, dando pitaco. É, só se for daqueles de bolado, que nem coando fino dá para saber o que é que tem dentro.

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