segunda-feira, 4 de julho de 2011

Paráfrase sentimental.






Na terça-feira passada li a coluna do Ivan Martins na Época. Amor bom é facinho, o título. Fiquei um pouco surpresa, confesso. Primeiro com o assunto sócio-afetivo, e depois com o título, digno de hit sertanejo universitário. (Cheguei a fazer estrofe de rima rica com amor bom é facinho e depois ritmei. Sucesso, na certa). 

Vencido o preconceito, li, devagar e compassada, de cabo a rabo, tomando o meu tempo para as reflexões que as linhas iam me exigindo. Terminei. Compartilhei com amigos. E passei os dois últimos dias com o assunto martelando a cabeça nos minutos vagos, e nos não tão vagos também. Creditei ao autor a coesão do texto, repudiei a objetividade com a qual ele tratou um assunto tão pouco quase nada objetivo. Resolvi então escrever eu, como que para organizar as idéias, com o perdão da paráfrase sentimental.

Para quem não leu a coluna, fala-se, em resumo, de como estamos acostumados a supervalorizar tudo aquilo que vem com esforço e dedicação. Mais que isso: fala-se de como fomos socialmente treinados a achar que só tem valor o fruto das duras penas, inclusive no campo afetivo. E nele, a conquista, o flerte, os jogos de advinha o-que-eu-sou-e-o-que-é-que-eu-quero. O fiz de conta que não vi que você me ligou e o estou muito ocupado para tentar denovo que vem de troco. O você não sabe o que eu penso e o que eu sinto. E depois disso, o esforço de um, que acha que é com ele que se conquista e que se vai, de jeito ou de outro, chegar lá.

O contraponto do autor, baseado na experiência pessoal, é o de que, na maioria das vezes, com os relacionamentos, a história é diferente. Não se joga xadrez. Não se tem oponente. Se gosta, se identifica, se encontra. E pronto. Easy as pie. Será?

Não sei a resposta. Nem acho, na verdade, que ela exista, assim, curta e direta, simples e objetiva. Talvez ela exista para o Ivan, homem, meia-idade, casado e descasado. Para mim, e tenho a impressão de que para a maioria das mulheres da minha idade, o rolo é maior que novelo de lã e não há perspectiva de desemaranhar. Explico.

A minha geração, e as gerações depois dela, receberam e recebem os mais diversos estímulos. A maioria, conflitantes. Geração cérebro de pipoca: romances do Machado de Assis seguidos de filmes Hollywoodianos do amor de enredo, que sai correndo no aeroporto aos 45 minutos do segundo tempo para pedir perdão e propor casório. Histórias de vô e vó, de amor construído, cultivado aos poucos, compartilhado, bem no intervalo daquela novela da Globo onde a mocinha estava com um irmão, depois fez que resolveu casar com o outro. Atriz que tem 5 filhos, um de cada pai e o quinto de um super amigo homossexual, e isso tudo aos 25 anos. Mulheres que se dedicam à carreira até os 40, para só daí pensarem em filhos, aos 41. O amor à duras penas convive com o amor fácil e com o amor líquido na minha sala de TV. E na do Ivan?
 
Acho mesmo que não há verdade ou mentira, certo ou errado. Ao que me parece, cada um é um, e cada caso é outro caso. E que, como o próprio Ivan disse, receita de bolo não há. Principalmente nos dias de hoje. Culpemos Freud, a mídia, Woody Allen e Godard. Culpemos o Zezé de Camargo, as novelas da Globo, o facebook e o dia nos namorados. Culpemos os que vivem repetindo que a vida é simples, nós que complicamos, Mário Quintana, Lenine, a Carrie Bradshaw e o Mr. Big. Culpemos mãe, pai, avós, ex-namorados e o Drummond, que um dia me disse sossegue, o amor é isso que você está vendo, hoje beija, amanhã não beija, depois de amanhã é domingo e segunda-feira ninguém sabe o que será. Culpemos os fabricantes de caixas de chocolate em formato de coração. E os editores de cartões comemorativos, que põe palavras nas nossas bocas. Culpemos todos os poetas. Todas as músicas lentas do mundo. Culpe-se quem ou o que quiser, a verdade é uma só: a minha geração não sabe o que é o amor.

A minha geração sabe, e aí sim, o que é amor próprio. Aquele egoísta, que olha no espelho, depois para o umbigo. Do amor de verdade, strictu sensu, amor romântico, amor ao próximo, esse daí  é só um bando de estímulos. Perdeu a identidade. 

Fala-se dele, duvida-se dele, discute-se ele. Desenham ele. Vendem ele. Escrevem sobre ele. Sentir que é bom, nada. Ou muito, muito pouco.